sexta-feira, 10 de abril de 2009

“Para muito além dos facões..."

Professor Nazareno*

A propósito das reações ao texto... “Em Rondônia é assim mesmo...”, publicado em alguns sites da capital e neste Blog, percebo como perfeitamente aceitável o fato de que pessoas se indignaram bem como louvável também o fato de que algumas outras me apoiaram. O problema ainda continua sendo a reação daquelas que não conseguiram ter reação, ou por que não leram, ou por que leram e não entenderam, ou por que simplesmente não se interessam por este tipo de discussão. “O contrário do amor não é o ódio, mas a indiferença”, diz assim um velho ditado popular. Por isso o texto em questão é antes de tudo uma declaração de amor a Rondônia, mais especificamente a Porto Velho. É um grito indignado contra os revezes impostos pelo capital ao nosso já cambaleante meio ambiente amazônico. É um grito de dor pela História que desaparecerá. Se a Madeira - Mamoré é ensinada religiosamente como parte integrante do nosso passado, ela não mais será necessária: as cachoeiras que lhe margeiam os abandonados trilhos desaparecerão para sempre nos futuros navegáveis trechos que lhe deram origem. Como prostitutas ordinárias, dissemos sim ao cliente (Senhor Corrêa) que nos usa e abusa, e ainda me paga com dinheiro imprestável e sujo de gesso que cai em nossas cabeças. Se me estupram, por que tenho ainda que pagar pelo preservativo? Não há outro animal que ria da própria desgraça senão a hiena que se alimenta de carniça... Digo hiena para não ofender araras, papagaios, antas, pacas, capivaras...
Somos mais ou menos quatrocentas mil almas e quase fomos vencidos por apenas uma: a da senhora Andrea Rocha Izac, aquela que dizem ter dado uma entrevista a Eliane Brum, repórter da revista Época logo após a publicação do meu texto. Ela merece uma estátua bem grande, de uns 50 metros de altura lá na Avenida Jorge Teixeira ou no Centro da cidade, ou em outro lugar, por ter ‘levantado a lebre’. Toda vez que um porto-velhense a visse, lembraria das mazelas desta cidade e cobraria providências dos seus desastrados administradores, que são cegos, relapsos ou incompetentes, por falta de dinheiro ou de capacidade de administrar o dinheiro que têm à disposição. Seria bom perguntar por que apesar de tão pequena, esta cidade pode ser mais violenta do que o Sul do Pará ou o Rio de Janeiro das intermináveis guerras em suas favelas. Ou por que produzimos tantos pobres, apesar das muitas chuvas, quanto o árido sertão do Nordeste. Políticos são mortos e já o foram em outros lugares do Brasil e Secretários de Segurança Pública também, mas se esses casos acontecem aqui, no nosso quintal, têm e devem ser motivos de preocupação para todos nós.
Quem sabe esta estátua não faria os rondonienses lembrarem do melhor executivo do mundo, apontado pela revista Financial Times de Londres, Carlos Ghosn, o todo-poderoso presidente da Renault e da Nissan? "Ghosn tem um cérebro privilegiado. É capaz de empacotar centenas de dados ao mesmo tempo e utilizá-los de forma a enxergar o que ninguém vê", afirmou recentemente Jean-François Manzoni, professor de liderança e desenvolvimento organizacional do Instituto Internacional para o Desenvolvimento da Administração, na Suíça, que já esteve com Ghosn várias vezes. Poderíamos nos lembrar também de José Maurício Bustani Júnior, diplomata de carreira e que foi eleito diretor-geral da Organização para a Proibição das Armas Químicas (OPAQ), subsidiária da ONU, Organização das Nações Unidas, para o período 1997-2000, e reeleito para o período 2001-2005, mas não chegou a concluí-lo, por insistência do governo dos Estados Unidos em sua remoção, que ocorreu em 2002. Bustani conseguiu ‘peitar’ os falcões do Pentágono e enfrentou nada menos que George W. Bush no episódio das armas químicas e de destruição em massa que Saddan Hussein não tinha. Na época, a União Européia admitiu concordar com o relatório feito por ele e que denunciava os norte-americanos. “Não se faz uma guerra baseando-se numa mentira”, teria afirmado sobre o episódio, frase copiada por vários líderes mundiais.
Bobagem dizer que estes dois grandes homens são rondonienses e filhos de Porto Velho se aqui temos a “Bailarina da Praça”, “Manelão” da Banda-do-vai-quem-quer e Zezinho do bloco carnavalesco Maria Fumaça, e que justiça seja feita, fazem a alegria de todos. Qual o lugar do planeta que não se orgulharia daqueles dois filhos ilustres e abençoados? Será que Porto Velho já ouviu falar deles? Meus filhos já! Bisnetos de Parintintins, da margem direita do Madeira, sempre foram ensinados a amar esta terra, já que eu, “comedor de calango”, não posso. Eles são ensinados a não votar mais em prefeitos com o maior número de obras inacabadas do Brasil. Foram ensinados a repudiar uma população que literalmente defeca em seus monumentos históricos (os bravos pioneiros devem chorar quando vão à E.F.M.M). Eu choro quando volto à Calama dos casarões do Segundo Ciclo da Borracha que estão apodrecendo. Meus filhos também são ensinados a não adotarem o senso-comum quando tiverem que repudiar uma opinião. E já sabem que não adianta citar Voltaire quando os facões estiverem zunindo rente às suas cabeças. Mas, teimosos que são, insistem em querer ouvir Mp3, esnobar o novo celular para os amiguinhos, navegar na Internet, curtir MSN e Orkut e se encantar com Shopping Center e McDonald’s da vida achando que o papai e a mamãe, às vezes altos funcionários do Estado, lhes darão qualquer cobertura. A cidade de Porto Velho é mesmo este paraíso de coelhinhos saltitantes e borboletas azuis e por isso canta-se “Céus de Rondônia”, na versão oficial, e finje-se não existirem outras interpretações. “Maquio o monstro e faço plásticas no cadáver” e ainda consigo dormir em paz comigo mesmo.
Bravos rondonienses de Porto Velho, guardem seus ‘cravinotes, busquetões e trabucos’. Eu sou da paz, mas digam ao mundo que vocês, como rondonienses que são, ainda têm Vilhena (“que nem calor opressor tem”), Cacoal, Ariquemes e Rolim de Moura, para não citar outros exemplos de cidades interioranas deste estado, que deviam fazer parte do Primeiro Mundo. E que com apenas trinta aninhos ou menos, nos dão muita inveja, mesmo com alguns defeitos, pela sua pujança, organização e desenvolvimento. Admitam o péssimo atendimento médico que temos em Porto Velho tanto na área particular como, principalmente, na área pública e que foi denunciado pela revista Época e aceitem que não estamos encontrando saídas para este e para outros gravíssimos problemas. Só podemos transpor os nossos obstáculos se conseguirmos vê-los e entendê-los e não será apontando os defeitos alheios que resolveremos os nossos. Expulsem todos os que falam mal desta cidade, mas isto não aumentará os apenas três por cento de saneamento básico nem os ridículos 20 % de água tratada que temos, apesar de termos o já sentenciado de morte rio Madeira correndo bem ao nosso lado. Rogo-lhes perdão, mas isto também não resolverá os buracos das ruas e avenidas, os infernais engarrafamentos, a violência, a sujeira, a falta de ética na política local, as epidemias e nem nos devolverá a Jorge Teixeira e a Imigrantes, avenidas que o atual prefeito deu de presente ao Governo Federal. Perdoem-me, rondonienses, mas saibam que o ônibus continuará caro, a carne e o aluguel também e o porto que dá nome à cidade ainda não será porto. É apenas um barranco sujo e mal cuidado. Degolem-me, mas não se esqueçam de prestigiar o clássico do futebol local e de comprar pupunha, açaí, biribá, pequiá, bacaba, bacuri e tantas outras deliciosas iguarias regionais quando forem, em junho próximo, ao arraial “Flor do Maracujá”.


*É professor na Escola João Bento da Costa em Porto Velho

Fonte: www.blogdotionaza.blogspot.com

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